POR LUIZ FERNADO VERÍSSIMO
Um cenário limpo. Fundo azul. Deus fala para
a câmera.
"Meus filhos, boa noite. Eu sou Deus
Vosso Senhor. Se me permitem a imodéstia, acho que não preciso me apresentar.
Meu currículo é conhecido de todos. Criador do céu e da terra, etc. A minha
vida é um livro aberto, e se chama Bíblia. Minha assessoria me advertiu que
estaria havendo uma certa falta de comunicação entre nós e que existiriam
algumas dúvidas sobre o meu trabalho, os meus métodos - enfim, sobre qual é a de
Deus, afinal. Por isto, optamos por este formato de uma conversa descontraída,
sem trovões, sem relâmpagos, sem efeitos especiais ou anjos com clarins, apenas
um papo informal entre Criador e criaturas.
Antes de mais nada, quero esclarecer que, ao
contrário do que alguns jornais andaram publicando, escolhi a Globo para falar
com vocês do Brasil por uma razão muito simples, que não tem nada a ver com
ibope, cachê, favoritismo ou qualquer prevenção com o Ratinho. É que o dr.
Roberto foi o único que me contatou diretamente.
E aqui estou eu para responder às suas
perguntas. Sei que muitas vezes o que eu faço parece incompreensível. Quantas
vezes você não se perguntou por que eu fiz isto ou aquilo, não é verdade?
Quantas vezes, quando estragou o ar condicionado no cinema ou o filme saiu de
foco, você não olhou para o alto e disse "Ó, Deus!", cobrando uma
providência divina? Quantas vezes você se perguntou por que existem os
desastres naturais, e a caspa, e aquele nervinho da carne que fica preso entre os
dentes, e o Sérgio Naya, e os alarmes de carro que disparam e não aparece
ninguém para desligar, e a colher que cai dentro do molho e depois lambuza a
mão, e a doença, e a morte, e o IPMF? Por que alguns tiram a sena acumulada e
eu não ganho nem rifa? Qual é a de Deus, afinal? Pensam que eu não sei? Eu sei
de tudo. Sei o que você pensa a cada minuto. Pelas minhas costas ninguém fala!
Posso responder a todas as suas perguntas. O
caso do "El Niño", por exemplo. Como todos sabem, o tempo é o maior
problema da minha administração. Requer uma organização imensa, difícil de
controlar, e os encarregados nem sempre estão à altura das suas tarefas.
Mantenho o São Pedro na chefia do setor porque foi um dos nossos primeiros
companheiros, mas há muito ele perdeu seu interesse no trabalho e o resultado é
que o clima do mundo está essa confusão. Estamos tentando melhorar, no entanto,
e pensando, inclusive, em terceirizar o serviço, e em pouco tempo tudo voltará
ao normal. Aproveito a oportunidade para dizer que são infundadas as notícias
de que um meteorito se chocará com a Terra em breve e a destruirá. Não temos
nenhum plano de acabar com a Terra num futuro próximo, inclusive porque ela tem
um grande valor sentimental para nossa família.
Selecionei algumas cartas para responder no ar.
A Ivani, de Londrina, Paraná, me pede para arranjar um encontro dela com o
Fábio Junior. Ivani, acho que você não pegou bem o espírito do programa. E o
Leôncio, de Santo Antônio, no Rio Grande do Sul - velho Antônio - escreve:
"Gostaria que o Senhor explicasse para que existem as unhas do pé."
Aí está, uma pergunta objetiva e séria. Para que servem as unhas do pé. Deixa
ver. As unhas do pé, por que eu criei as unhas do pé... Faz tanto tempo... Mas
vejo que o nosso tempo está se esgotando. Mandem as suas cartinhas! Tentarei
explicar todos os meus atos numa linguagem acessível, sem tecnicalês, que
qualquer leigo pode entender. Se preferir telefonar, o prefixo do céu é 02,
porque 01 são os Estados Unidos. Só não atenderei se estiver em reunião. Ou então usem
meu e-mail, Poderosíssimo@com.ceu.
Até a próxima, e fiquem comigo."